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segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Adeus, crianças


Com absoluta propriedade, a escritora estadunidense Elizabeth Stone pontificou, certa feita, que a decisão de ter um filho é muito séria, equivalente a decidir ter, para sempre, o coração fora do corpo. Como pai, concordo em gênero, número e grau com essa afirmativa. Toda vez que as nossas já crescidas crianças estão num programa longe de nós, de mim e da mãe, por mais que saibamos onde e com quem estão, ficamos minimamente aflitos com a sua ausência, pelo zelo natural de guardiães que haveremos de ter para sempre. E somente descansamos quando sabemos que chegaram à segurança do lar, debaixo das nossas asas protetoras.

E não é diferente da parte dos meus ‘meninos’ para comigo, apesar dos meus 50 anos e dos mais de 90, por exemplo, do meu pai. É da natureza dos pais essa preocupação com o bem-estar dos seus rebentos. A gente – fazer o quê – doma a ansiedade, tenta manter um certo controle da situação e, sobretudo, reza para que tudo esteja e permaneça em ordem. Porque a liberdade é necessária e, um dia, fomos nós que a reivindicamos, perante os nossos pais.

Meus filhos, um lindo casal com 20 (ele) e 18 anos, se encaixam com exatidão na faixa etária dos muitos que pereceram na madrugada de domingo passado, dentro do inferno em que se transformou a boate da pequena Santa Maria, no interior gaúcho. Foi um dia que, tão longe, aqui no Rio de Janeiro, não amanheceu, envolto nas trevas de uma madrugada que ousou não terminar. Um domingo de breu, cuja única luz parecia vir das chamas que consumiram a festa convertida em tragédia.

O Brasil ficou menos jovem, neste 27 de janeiro. Nós, pais de todo o país, embora fisicamente distantes dessa desgraça, não estamos indiferentes ao sofrimento de tantos e tantos pais, avós, irmãos, primos, namorados e amigos, que choram o arrancar precoce de seus queridos da vida que estavam a comemorar, em meio à alegria que até então reinava. Um pouco de cada um de nós, que se compadece em luto, morreu junto com aqueles meninos e meninas.

Mas, seguir adiante é preciso. Suportar a ferida com Amor e coragem, até que reste apenas a cicatriz com a qual sobreviveremos. Superar a dor imensa que abate a alma, lembrando que a estranha leveza que, às vezes, parece se apossar da gente nessas horas e nos tirar o chão, é exatamente o momento em que o Senhor assume o nosso fardo, e se põe a nos carregar no colo.

Vão em Paz, crianças.

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ConCidadão
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